quinta-feira, 7 de maio de 2015

MERITOCRACIA ELEITORAL ( OU A CULPA É DA ESQUERDA ? )

Tenho ouvido insistentes argumentos em favor dos recuos na pauta governamental, sufragada nas ultimas eleições, mais uma vez, com o apelo ao eterno mantra da governabilidade, adicionado de um novo elemento: a meritocracia eleitoral.

Segundo esta lógica, a culpa da nomeação da miss do trabalho escravo, Katia Abreu e do discípulo de Arminio Fraga, Joaquim Levy ( E DA VITORIA DE EDUARDO CUNHA) é da esquerda que não "conseguiu" eleger uma bancada expressiva no Congresso.

Curiosamente, esta cobrança é feita depois da campanha eleitoral mais cara da história brasileira, manietada pelos interesses do agronegócio, dos Bancos e empreiteiras.

Sim, parte expressiva da esquerda foi "incompetente" para jogar segundo as regras do jogo, captar milionários patrocinadores, haja visto a diminuição considerável da bancada de esquerda, na área de educação, por exemplo.

A circularidade argumentativa da "realpolitik" só não responde qual o caminho de saída do labirinto que alimentamos, nestes últimos anos.

Pois se a Reforma Política - tida como panaceia- só pode ser realizada com o apoio do congresso conservador, esta não é uma opção.
A segunda porta mágica, a realização de uma constituinte exclusiva e mesmo o Plebiscito, carece de razoabilidade, de vez que é justo imaginar que sem o fim do financiamento privado, teremos uma nova eleição com "mais do mesmo".

Se não temos correlação de forças para enfrentar o Congresso, o STF e a Mídia ( também sustentada com verbas públicas), que esperanças podemos legar aos que votaram numa plataforma que prometia o aprofundamento das mudanças?

Alias, diga-se de passagem, esta propaganda foi intensificada pela candidatura de Dilma, no segundo turno, quando já se conhecia o perfil conservador do Congresso.

O que fazer agora agora? Publica-se uma errata, no programa eleitoral? Pede-se mais 12 anos de paciência? Reza-se para que a conjuntura política e econômica altere-se, metafisicamente?
E enquanto isto, continuamos a alimentar adversários e aliados de ocasião, até o ponto em que eles nos sufoquem, de vez?

O decréscimo eleitoral das candidaturas presidenciais do PT sinaliza o resultado desta politica da governabilidade sem enfrentamentos e de recuo.

E, ainda assim, há aqueles que desaconselham a crítica, pelo medo de "provocar a reação da direita" e o "golpismo".

Ora, a direita nunca deixou de agir - mais silenciosa ou ruidosamente - jamais suportou políticas para além do melhorismo e da democracia de vitrine ( e às vezes, nem estas).

Mudanças estruturais, neste país, a favor dos trabalhadores/as, nunca foram conquistadas em silêncio e sem muita mobilização social.

Não será diferente, desta vez. 
Os que pedem a calmaria, devem saber que estão escancarando as portas para os setores dominantes, hábeis em operar, sinuosamente, nos bastidores.
Que não arrependam-se, portanto, do script que desenham, por omissão ou opção.

UM MARXISMO FUNCIONAL?


Tenho lido muita gente usar e abusar de palavras do vocabulário marxista como "práxis", "correlação de forças" e especialmente, "contradição" para fazer o contrário do que Marx sugeriu: "interpretar a realidade, ao invés transforma-la".
A contradição - ideia-força- nesse discurso, é tomada de forma idealista e estática.
Uma passinho a mais e passamos a dialogar com o funcionalismo liberal: aquele que nos ensina que a sociedade é um sistema ( sistêmico é também um novo bordão dos ministros!) e que tal como o corpo humano tem disfunções ( os neomarxistas justificadores equivalem este termo à contradição).
Para corrigir estas "disfunções" basta alguma alquimia que reequilibre o sistema.
Na arquitetura política, que justifica o "Ministério da Governabilidade tal como ela é", basta dosar um pouquinho de Katia Abreu, com uma pitadinha de Patrus Ananias; um tiquinho de Berzoini com uma dose de Joaquim Levy/BRADESCO; um fundamentalista religioso de cá e um representante das minorias, de lá; meritocracia suavizada por Mangabeira Unger e "ajuste" nos benefícios previdenciários defendido pelo Mercadante; Miguel Rosseto no diálogo com os movimentos sociais e o filho de Jader Barbalho para os pescadores; Jacques Wagner para adoçar os militares e Pepe Vargas para segurar o Congresso.
O problema é que contradição não é febre que se cura com analgésico.
É estrutural de um sistema onde há antagonismos de interesses de classe e não, cândidas diferenças- que podem ser salvas com "diálogo"! O nome disto é conciliação.
Por isso, disputamos eleições e projetos. Caso contrário, um algoritmo resolveria o problema da "unificação da Pátria".
Que alguns acabem por enganar-se porque nossa tradição positivista é mais forte do que a crítica dialética, entendo.
Que outros, conscientemente, subvertam ideias de uma teoria que conhecem, não dá para justificar.
A história da esquerda já testemunhou tais posturas e sabemos a que elas serviram...

segunda-feira, 4 de maio de 2015

A OUTRA VERSÃO DA FÁBULA PEDRO E O LOBO – ou das “Artimanhas da Governabilidade Negociada”.


Pedro era um jovem, de uma aldeia de pastores. Há tempos, a pequena vila vinha sendo vítima do desmantelamento de seus rebanhos de ovelhas ante as vilanias dos lobos da região.

Pedro lançou sua candidatura a pastor oficial do vilarejo. Na campanha, apresentou as credenciais da coragem e valentia, e prometeu combater sem tréguas os inimigos dos rebanhos.

Foi eleito com o apoio massivo da população que não aguentava mais sofrer.
Logo na sua primeira missão, confrontou-se com a matilha. Pensou, calculou e achou que não teria forças para vencê-los, também não podia apresentar-se como derrotado ao povo que nele confiara.

Foi aí, que teve a ideia brilhante: negociar com os lobos.

Fez a proposta: “Vocês ficam com dez por cento do rebanho e me deixam seguir com o restante, sem lutas, sem conflitos”.

Os lobos acharam bom, o negócio.

Pedro voltou ao vilarejo e o povoado não percebeu que faltavam algumas ovelhas. Feliz, acreditou que sua estratégia era a melhor possível.

No dia seguinte, voltou a pastorear. Os lobos pediram 20%. O pastor titubeou, mas assentiu. Afinal, o povo não tinha notado os primeiros dez por cento.

E assim foi, a cada dia mais dez por cento do rebanho era entregue aos lobos.
Pedro voltava ao vilarejo, pacífico e solerte, e preenchia o vácuo com discursos inflamados em favor do patriotismo da aldeia e da resistência pacífica.

Quando ao final, restava pouco mais que 30% do rebanho, Pedro percebeu que já não poderia prosseguir e resolveu enfrentar a matilha.

Os lobos trucaram: “Você vai lutar sozinho contra nós?”.

Ao que Pedro redarguiu: “Vou chamar o povo da aldeia. Vou gritar é o Lobo, é o Lobo”.

O general dos lobos sorriu e disse: “Experimente chama-los. Vamos lhes contar que você tem negociado conosco, neste tempo todo. E afinal, eles nem mais lembram que existem lobos, não é?”.

“Bem - pensou Pedro- acho que eles já se acostumaram a viver sem algumas ovelhas.”